quarta-feira, outubro 22, 2008

parei. o Bite morreu. dói.

Hoje parei.

Depois de estar de férias e voltar ao trabalho, depois de organizar a Noite da Medicina, parei.

O Bite morreu (ponto final) E fico pendurada neste ponto final com a dor que a finitude causa..., face à efemeridade da vida confrontar-me com a eternidade da morte parece absurdo, sem sentido.

revolta-me a reacção das pessoas. não é bem revoltar. magoa que não percebam. é que dói. e o bite não era um brinquedo, um objecto, um "bicho". quando conto a alguém que o Bite morreu a resposta passa quase invariavelmente do "ai que chato!" para o rápido "Vão comprar outro?". como se fosse um casaco que se sujou, uma biciclete que se partiu.

não percebem que o mundo com o Bite acabou. e é só isso que importa. se fosse um casaco nao chorava. não hoje quando parasse tudo e me desse tempo para perceber a falta que me faz.

o Bite tinha 14 anos. eu só tenho mais dez. os primeiros 10 anos são os mais fáceis da vida. os pais fazem tudo por nós. depois somos adolescentes e afastamo-los e só conseguimos complicar tudo. mas depois tinha o Bite. e o Bite sabia sempre o que fazer. agora por exemplo nao me deixava aqui a um canto a chorar como uma criança. ao contrário do Kaos e da maior parte das pessoas, que não sabem lidar com as minhas lágrimas, o Bite tinha o dom especial de me saber mostrar a relatividade das coisas.. vinha de mansinho, pedia licença com uma lambidela e tratava de mim. quando eu retribuia com uma festa ou quando o olhava nos olhos começava logo a abanar o rabo como se me visse de novo em mim.

o Bite despediu-se no dia 13 de Outubro, um dia depois de eu voltar de Paris. estava doente já há uns meses com um linfoma e não resistiu mais. Já praticamente não comia, não andava, não ia à rua. No sábado à noite quando cheguei juntou forças e ladrou para mim, como fazia sempre quando o deixava em casa e não o levava nas minhas aventuras fora de portas. o Bite não podia sair à rua sem trela porque não achava limites no mundo, queria descobrir tudo.

sinto-me sem limites na minha dor, no vazio que deixou, nas saudades que vão durar para sempre.

depois da efemeridade da vida haverá sempre a eternidade da tua memória na minha finitude.

quinta-feira, fevereiro 28, 2008

“Certa vez, atravessando um rio, Cuidado viu um pedaço de terra argilosa: cogitando, tomou um pedaço e começou a lhe dar forma. Enquanto refletia sobre o que criara, interveio Júpiter. O cuidado pediu-lhe que desse espírito à forma de argila, o que ele fez de bom grado. Como cuidado quis então dar seu nome ao que tinha dado forma, Júpiter proibiu e exigiu que fosse dado seu nome. Enquanto Cuidado e Júpiter disputavam sobre o nome, surgiu também a Terra (Tellus) querendo dar o seu nome, uma vez que havia fornecido um pedaço do seu corpo. Os disputantes tomaram Saturno como árbitro. Saturno pronuniou a seguinte decisão, aparentemente equitativa: ‘Tu, Júpiter, por teres dado o espírito, deves receber na morte o espírito e tu, Terra, por teres dado o corpo, deves receber o corpo. Como porém foi o Cuidado quem primeiro o formou, ele deve pertencer ao cuidado enquanto viver. Como, no entanto, sobre o nome há disputa, ele deve chamar-se “homo”, pois foi feito de humus’.”

(Fábula do cuidado - Higino, apud Heidegger)


Faz hoje um mês que partiste. E sinto. (-te) Sinto muito. Sinto muito a tua falta.
Voltaste à terra, ao céu, e eu que te cuidei como pude sinto a tua falta.

Sinto falta do teu sorriso rasgado, das tuas festinhas meigas no meu cabelo. Sinto falta do arroz doce que desapareceu deste mundo pois nunca ninguém o conseguiu fazer como tu. Sinto falta de ti. De te telefonar e ouvir-te rir. E dizeres que só eu te fazia rir assim. A última vez que falaste foi no dia de Natal, olhaste-me e viste-me, não com aquele olhar vazio que se apoderou de ti nos últimos dias… olhaste nos meus olhos, e embora não falasses há semanas, os teus olhos brilharam e disseste, “minha carinha linda”, foi o meu presente de Natal. Depois voltaste ao silêncio até apareceres curada, nos meus sonhos, a dizer disparates nos últimos dias..




You said when you'd die that you'd walk
with me everyday
And I'd start to cry and say please don't talk that way
With the blink of an eye the lord came
and asked you to leave
You went to a better place but He stole you
away from me

And now she lives in heaven
But i know they let her out
To take care of me

There's a strange kind of light
Caressing me tonight
Pray silence my fears she is near
Bringing heaven down here

I miss your love i miss your touch
But I'm feeling you everyday
And i can almost hear you say
"You've come along way baby"

There's a strange kind of light
In my bedroom tonight
Prayer silence my fears she is near
Bringing heaven down here

You taught me kings and queens
While stroking my hair
In my darkest hour I know you are there
Kneeling down beside me
Whispering my prayer

The next time that we meet
I will bow at her feet
And say wasn't life sweet
Then we'll prepare
To take heaven down there


Uma das mulheres mais importantes da minha vida despediu-se faz hoje um mês.
Fica a minha mais sincera homenagem à minha avó.

És linda e sinto a tua falta.

Maria Eduarda de Jesus Correia